NATAL PRESS

Alvorada, anúncio de um novo dia. Sou um madrugador. Hora que seja ao dormir, cinco e meia estou de pé. Sem alvoradas ou alarmes. Internalizei o meu despertador. Outros, precisam de ajuda. Antigamente, tínhamos o canto do galo. Na caserna, o clarim. Depois, relógios de corda com um tímpano no topo. Em seguida, os eletrônicos. Alguns, são forçados a acordar. Um radioamador amigo em Maceió era despertado com a bigorna do pássaro ferreiro do vizinho, quatro da manhã. Vingou-se com alto-falantes em cima do muro, sintonizado no máximo volume numa dessas rádios sertanejas. Fizeram um acordo: o vizinho desligou o pássaro e ele o rádio.

Comigo agora é diferente. Esta semana fui privilegiado. Acordei com uma alvorada. Alvorada canina. Meu prédio é relativamente pequeno. Apenas 22 apartamentos. Na maioria, ocupados pelos proprietários, alguns alugados, mas todos, repito, todos, para felicidade geral do edifício, civilizados. Mesmo as crianças, que são poucas, são silenciosas. Portanto, tudo muito tranqüilo.

Nossa convenção de condomínio é liberal. Permite a existência de micro cachorros. Esquecemos que eles mordem, mas especialmente latem. E latir faz barulho. Não chega a incomodar muito, e geralmente só fazem alvorada, mas latem. Votei a favor da convenção. Nem estou reclamando, apenas comento. Nem quero expulsar os cachorrinhos.

Já fui criador de cachorros. Quando morava numa casa, criava, mais por segurança do que outra coisa, cães pastores. Bonitos, fortes, corajosos, me davam uma sensação de segurança, mesmo tendo sido, quase todos, mortos por “bolas”. Para quem não sabe ou não se lembra, era como se chamava a comida envenenada, que jogavam por cima do muro. Hoje, tenho um único cachorro no meu apartamento, esculpido por um amigo em pedra sabão e que m’o presenteou. Não late, não suja a casa, quieto. Como eu gosto. Se a nossa é uma convenção liberal, outras há que não o são. Aqui em Natal mesmo, conheço alguns edifícios que não permitem quaisquer cachorros. Decisão livre e aceita por todos, nada a contestar.

Quando fui morar em Washington, começo dos anos setenta, fiquei um tempo num hotel, buscando apartamentos. Preço, localização, tranqüilidade, eram dos principais ingredientes envolvidos na escolha. Visitei vários. Encontrei finalmente um que me interessava e fui alugar. Bem recebido, tudo fácil, aluguel acertado. No hora de assinar o contrato, o responsável pergunta: o senhor tem filhos? De que idade? Sim, 9 anos. Infelizmente não podemos alugar o apartamento.  Nossa convenção não permite. A maioria aqui é de idosos e não querem crianças fazendo barulho, correndo, abusando dos elevadores, enfim, fazendo bagunças. Aí eu perguntei: permitem cachorros? Sim, desde que pequenos. Latem, mas não chegam a incomodar.

Comprei uma casa. Foi a coisa mais fácil do mundo. Sem escrituras e papeladas. Burocracia zero. Fui ao banco e fiz o financiamento. O recibo assinado pelo antigo dono foi enviado a Prefeitura, que transferiu a propriedade da casa para o meu nome. Nem precisei ir lá. Lembrei-me do Brasil.
E já que lembrei-me do Brasil, amanhã, dia 26, vote uma nova alvorada para o nosso país.



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