NATAL PRESS

Natal, antes e durante a II Guerra, quase até o seu final, só tinha comunicações com o resto do país por meio de cabotagem. Cabotagem, para quem não se lembra, é a ligação feita por navios entre portos nacionais.
 
Naquele tempo, o porto de Natal sempre tinha dois, três navios ancorados e havia uma escala normal. Os navios de passageiros, os famosos Itas da Costeira e os Lloyds, faziam escalas anunciadas, com datas que eram antecipadas e cumpridas, e permitiam que você se programasse. A partir de 1944/1945, caminhões começaram a fazer a ligação de Natal com o Sul. E as mercadorias, que vinham de navio, passaram a ser transportadas por via terrestre, mais baratas e eficientes. A ameaça dos submarinos, que afundaram navios brasileiros, teve forte influencia nessa modificação. Depois da guerra ainda continuaram por algum tempo.
Fiz algumas viagens de navio, a primeira delas de Natal à Recife, num Ita. Depois fui para o Rio (1949) e, quando estudava em Maceió, fiz muitas viagens para lá. Era a forma mais fácil, rápida, confortável e econômica de viajar. Depois surgiram os aviões em maior quantidade e a preços razoáveis.
 
Para ir à Recife, que era mais difícil do que ir à Europa hoje (e era), se tinha três opções: navio, trem e ônibus. A mais rápida e confortável era de navio. Você saía daqui ao anoitecer e amanhecia em Recife. De trem, saía as cinco da manhã e, se estivesse dentro do horário (e nunca estava), você chegava as nove da noite. E ônibus, sem estradas que prestassem, dependia da sorte. A mais famosa viagem terrestre era pela “marineta de Chaveta” (uma espécie de van), que poderia levara de 12 a 24 horas, dependendo e chovia ou não.
 
Fiz essa viagem por todos esses meios. Lembro-me da minha primeira viagem à Recife, de trem, que milagrosamente chegou no horário. Fui com meu pai e minha mãe assistir a formatura de meus tios Protásio e Pelúsio, em 1936. Recordo a macarronada que comemos no vagão restaurante, com queijo do reino ralado e um pãozinho quente com mantegia; nunca esqueci. Fui de navio algumas vezes, a viagem mais confortável e com chegada prevista e obedecida. E fui algumas vezes na marineta de Chaveta. Numa dessas viagens, chovendo, estradas enlameadas e escorregadias, rio Mamanguape cheio que não permitia sua travessia (não existia ponte), fomos por Sapé, o que aumentava as horas de viagem. Levamos umas 12 horas.

O “Rio das Antas” foi um dos últimos navios cargueiros de cabotagem com destino à Natal. Vinha de Porto Alegre, com escala em Santos e no Rio. Muitos comerciantes de Natal tinham mercadorias para receber por esse barco. Nosso escritório de representações tinha vários conhecimentos de mercadorias embarcadas nesse navio (conhecimento era o documento que confirmava o embarque da mercadoria e permitia sua retirada do porto).
 
Esse navio praticamente desapareceu. A última notícia que se teve dele foi a internação em Ilhéus, que não estava em sua rota e onde parou para reparos. Daí em diante, nunca mais houve notícias da continuação de sua viagem e nunca chegou aqui. E virou motivo de piada. Quando você procurava uma mercadoria qualquer e não encontrava, surgia a pergunta: vinha no “Rio das Antas”?
 
Pode-se afirmar, sem dúvidas, que esse navio marcou a vitória dos caminhões sobre os navios, no transporte de mercadorias do Sul para cá. Frete mais barato, entrega de porta a porta, recebimento de indenizações por danos, imediata (era descontado do frete a ser pago) e cada vez mais rápido e seguro, à medida que melhoravam as estradas.


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