A população católica do RN recorda no feriado religioso do dia três de outubro, o massacre dos Mártires de Cunhaú e Uruaçu, quando no ano de 1645, cerca de 70 colonos foram cruelmente assassinados pelos índios janduís e potiguares a mando dos holandeses. O motivo: não aceitarem a imposição da sua religião - protestante calvinista. "Os mártires foram escolhidos como padroeiros do Rio Grande do Norte devido à importância do fato. Eles foram os primeiros mártires do Brasil, por isso o nome protomártires", explica padre Antônio Murilo de Paiva, Capelão dos Mártires.

Mas, para relatar essa página trágica da História, é necessário trazer à tona um personagem que tomou posição de destaque neste contexto: o alemão Jacob Rabbi, comandante da tropa de índios e holandeses. Inicialmente, era apontado como intérprete entre os holandeses e os tapuias, uma vez que ao chegar ao Brasil permaneceu durante quatro anos vivendo entre aqueles indígenas e assimilou os costumes nativos, num verdadeiro processo “indianização”. Rabbi vivia com uma nativa janduí de nome Domingas, num sítio de sua propriedade, chamado "Ceará". Ele é considerado pelos historiadores como uma das figuras mais sinistras, abomináveis e hediondas do domínio holandês no Nordeste do Brasil.

Jacob Rabbi e um grupo de índios janduís e potiguares, além de soldados holandeses, chegaram ao engenho Cunhaú, atual município de Canguaretama, em 15 de julho de 1645. Ele se apresentou como emissário do Supremo Conselho Holandês de Recife e convocou a população para uma reunião, após a missa do dia seguinte, dia 16, um domingo, na capela de Nossa Senhora das Candeias. 

Os historiadores estimam que 70 fiéis estivessem presentes no lugar, cumprindo apenas o preceito religioso, não portando armas. Durante a celebração, após a elevação da hóstia, os soldados holandeses trancaram todas as portas da igreja. A um sinal de Rabbi, os índios invadiram o local e chacinaram os colonos.
Relatos posteriores, alguns deles de emissários do governo holandês que investigaram o episódio, descrevem cenas de violência, atrocidades e requintes de crueldade contra os fiéis. Desarmados, os colonos não tinham como resistir e se resignaram à morte. Atendendo à exortação do padre André de Soveral, que celebrava a missa, muito foram executados em meio às orações. O próprio padre foi morto a punhaladas.

Três meses depois da tragédia de Cunhaú, no dia 03 de outubro, aconteceu o martírio de mais 80 pessoas, na Comunidade de Uruaçu, em São Gonçalo do Amarante, também sob o comando de Rabbi, ajudado pelo chefe da tribo Potiguar Antônio Paraopeba, “educado” pelos holandeses.
Depois do massacre em Cunhaú alguns moradores influentes, liderados pelo padre Ambrósio Ferro, que exercia as funções de vigário de Natal, pediram abrigo no Castelo Keulen, nome dado a Fortaleza dos Três Reis Magos, em Natal. Os que não foram, construíram uma paliçada para proteger a localidade conhecida como Potengi.

Pesquisas em documentos holandeses e portugueses mostram que o cerco à paliçada do Potengi durou 16 dias. Não há comprovação dessa ordem, mas o fato é que no dia seguinte, 03 de outubro de 1645, foram levados para Uruaçu: Antônio Vilela, Cid, seu filho, Antônio Vilela Júnior, João Lostau Navarro, Francisco de Bastos, José do Porto, Diogo Pereira, Estevão Machado de Miranda, Francisco Mendes Pereira, Vicente de Souza Pereira, João da Silveira, Simão Correia e o próprio padre Ambrósio Francisco Ferro, e foram todos executados. À morte deles, segue-se a chacina dos que estavam refugiados em Potengi, depois de terem sido retirados da paliçada e levados para o mesmo porto. Aponta-se que o lugar do morticínio ficava a aproximadamente 1 km de distância do povoado e era denominado “Tinguijada”, área onde hoje abriga o Monumento dos Mártires de Uruaçu.

Em reconhecimento ao feito dos Mártires de Uruaçu, em 16 de junho de 1989 o processo de beatificação foi concedido pela Santa Sé. Em 21 de dezembro de 1998 o papa João II assinou o decreto reconhecendo o martírio de 30 brasileiros, sendo dois sacerdotes e 28 leigos.A celebração de beatificação aconteceu na Praça de São Pedro, no Vaticano, no dia 5 de março de 2000. A cerimônia religiosa foi presidida pelo papa João Paulo II.
São, hoje, destinos de romarias e peregrinações, a Capela dos Mártires de Cunhaú e Uruaçu, em São Gonçalo do Amarante; o Santuário dos Mártires, no bairro Nossa Senhora de Nazaré, em Natal; e a capela de Nossa Senhora das Candeias, no antigo engenho de Cunhaú.

Homilia de João Paulo II na missa de Beatificação em 05 de março de 2000:
“São estes os sentimentos que invadem nossos corações, ao evocar a significativa lembrança da celebração dos quinhentos anos da evangelização no Brasil, que acontece este ano. Naquele imenso País, não foram poucas as dificuldades de implantação do Evangelho. A presença da igreja foi se afirmando lentamente mediante a ação missionária de várias ordens e congregações religiosas e de sacerdotes do clero diocesano. Os mártires, que hoje são beatificados, saíram, no fim do século XVII, das comunidades de Cunhaú e Uruaçu, do Rio Grande do Norte. André de Soveral, Ambrósio Francisco Ferro – presbíteros e 28 companheiros leigos pertencem a esta geração de mártires que regou o solo pátrio, tornando-o fértil para a geração de novos cristãos. Eles são as primícias do trabalho missionário, os protomártires do Brasil. Um deles, Mateus Moreira, estando ainda vivo, foi-lhe arrancado o coração das costas, mas ele ainda teve forças para proclamar a sua fé na Eucaristia, dizendo: Louvado seja o Santíssimo Sacramento”.

Fontes de consulta:
http://www.cnagitos.com/index.php/noticias/item/1384-entenda-os-massacres-de-cunha%C3%BA-e-urua%C3%A7u-data-que-%C3%A9-feriado-no-rio-grande-do-norte
http://g1.globo.com/rn/rio-grande-do-norte/noticia/2013/10/conheca-historia-dos-martires-de-cunhau-e-uruacu-no-rn.html
http://pt.wikipedia.org/wiki/M%C3%A1rtires_de_Cunha%C3%BA_e_Urua%C3%A7u
*Jornalista