Acordei me achando sorumbático. Como é uma palavra que não escuto, leio ou escrevo há tempos, resolvi ir ao dicionário para ver se correspondia ao que sentia. Eis o resultado: “característica do que é sombrio, carrancudo, tristonho, melancólico, taciturno; estava triste e sorumbático”. Encaixou certinho. Comecei a me analisar, para saber por que cargas d’águas estava tão sorumbático. Descobri; é que adoro as coisas simples e elas estão se complicando.

Adoro, por exemplo, um uisquinho doze anos (se não puder ser de 15, 18 ou 21, mais simples ainda), acompanhado de um tira-gosto inocente tipo caviar russo com cream-cracker inglês. Ou ver uma senhora, elegante e bem vestida, delicadamente levando seu filhinho bem cuidado à porta da escola, depois de descer de um BMW, dos grandes, dirigido por um motorista fardado. Que estaciona na primeira vaga de deficiente ou idoso que encontrar. E, se não encontrar, no meio da rua mesmo.

Atrapalha o trânsito mas, raciocina com a madame, vai demorar pouco. Adoro as coisas simples, como essas. Você já imaginou o que seja tomar um chá das cinco, chá inglês, ou indiano, legítimo, com “cookies and cakes” (tem que ser escrito em inglês, se não perde a simplicidade), acompanhado por um papo inteligente (cada vez mais raro) e ouvindo uma boa música clássica, que pode ser da Sinfônica de Berlim, tocando a 9a. de Beethoven e regida por Karajan? Adoro coisas simples assim.

Depois que fiz essa análise, melhorei imediatamente. Cheguei a conclusão que não eram as besteiras ditas pelos políticos em campanha, suas promessas vãs, seus comentários injuriosos ou não de uns sobre os outros, da falta de perspectivas em nosso futuro. Nada disso me abala mais, de tão habituado, de tão anestesiado que estou – e suponho que muitos também – com essa baboseira irritante que anda por aí. Que, diga-se, já não me irrita tanto. Deixei de escutar esses desagradáveis programas eleitorais. Nem ler a respeito. Mas soube em quem votar no dia 5 de outubro. E já tenho os meus candidatos definidos para o dia 26.

Simplesmente, retorno as coisas simples. Que me fazem um bem danado. Nesses momentos, você esquece o dia a dia maluco a que somos submetidos, contra a nossa vontade. Segurança, saúde, educação, e os problemas reais do povo, sem solução ou perspectivas de, pelo menos a médio prazo, são esquecidos. Não por desejo nosso, mas pela realidade antevista. Ou você esquece ou enlouquece. Como quero continuar são, nesse restinho de vida que ainda tenho, me volto às coisas simples. Que me perdoem os que gostam das coisas complicadas. Por exemplo, um café da manhã, com tapioca no leite de coco, queijo de coalho assado, manteiga do sertão e um pãozinho quente. Sem esquecer o mel de abelha no queijo. Uma das poucas coisas complicadas que ainda tolero.