NATAL PRESS

Parece um jogo de futebol, mas não é. Trata-se de um plebiscito a realizar-se no próximo dia 18, quando os escoceses vão dizer se continuam unidos com a Inglaterra e demais países do Reino Unido (País de Gales e Irlanda do Norte), ou separam-se. União de mais de 300 anos. Todas as últimas pesquisas indicam um páreo duro. Minha opinião é de que o bom senso vai reinar e a separação será rejeitada.

Se há algo positivo que nos deixou a colonização portuguesa foram a unidade territorial e a unidade lingüística. Tivemos algumas escaramuças, aqui e ali, mas sem maiores conseqüências. Há uma estória que contam de Dinarte Mariz – que tem muitas – que é ótima. Quando tinha raiva de Brasília, dizem, declarava alto e bom som: se O RN fosse independente, seria membro da OPEP. Uma das últimas histórias sobre separação de Estados no Brasil foi inventada por Getúlio Vargas; a de que a Revolução de 1932 em São Paulo teria motivação separatista. Foi o que me ensinaram na escola e só soube da verdade depois de 1945. Na realidade, os paulistas queriam uma Constituinte e acabar com a ditadura de Vargas. Daí o medo danado que tenho desses livros didáticos hoje feitos pelo MEC.

No resto do mundo, especialmente no Oriente Médio e nos Bálcãs, essa busca, muitas vezes sangrentas, por uma separação, continua presente. Aí estão os problemas dos países árabes, aí estão as dificuldades dos eslavos. No fundo, uma latente divergência religiosa. O caso da Irlanda do Norte é sintomático. Divergências entre católicos e protestantes até hoje geram problemas, que já foram muito graves e agora menos dramáticos. E que impedem um relacionamento civilizado com a Irlanda. Na Escócia não é diferente; são maioria de católicos; os ingleses, anglicanos. Lembram-se de Maria Stuart e Elizabete. Os argumentos apresentados para essa separação são ditos econômicos, o que não convence. Os gastos do governo na região são bem maiores, per capita, do que no resto da União. Segundo The Economist (2/8/2014), o estado britânico gasta US$2.500 a mais por pessoa por lá de que na União como um todo. E querem manter a libra como moeda. Diz Paul Krugman, no New York Times de 8 deste, que usar moeda de outro país nunca deu certo, já que não têm qualquer controle sobre ela. E há ainda dificuldades em separar as duas economias, tão integradas hoje em dia.

Há outros tipos de rivalidades que devem ter levado a essa situação. Durante a II Guerra, muitas vezes comandantes ingleses foram acusados de enviar tropas escocesas, e também, diga-se, canadenses, australianas e de outras colônias, para os combates mais duros. Tudo isso soma e leva a decisões, mais das vezes, insensatas.

Tive uma experiência interessante com essas divergências, e que me pegou de surpresa. Numa conferencia sobre Planejamento Familiar, num dos campi mais bonitos que conheci, da Universidade da Califórnia, em Santa Barbara – à beira mar, gramados belíssimos, tudo super limpo e organizado – fui cumprimentar um dos palestrantes, que falava inglês impecável. Sotaque oxfordiano. Perguntei, ao final da nossa conversa: o senhor é inglês? Não, sou britânico, respondeu com o que, para mim, pareceu certa irritação.

São essas coisas, que nos parecem pequenas, que nos levam à comportamentos desastrosos, mais das vezes violentos, e que resultam em mortes e selvagerias como as que estamos vendo pelo mundo afora.

Para encerrar, vejam o que escreveu, no Telegraph de 9/9, o senhor Ian Martin, comentarista político, ex-editor do “The Scotman” e do “Sunday Telegraph: “Em risco está uma maravilhosa União, com um mercado comum de sucesso e compartilhada herança artística, científica, diplomática, humanitária e de sucesso militar. Se tudo isso for perdido – sacrificada por uma mentira e substituída por amargura e ressentimento – será uma tragédia de proporções épicas”.

E o Financial Times de ontem adverte: “Vejam o exemplo de Quebec; ameaçou se separar do Canadá e em 1980 fez o primeiro referendum, 59 contra a separação. Mas o dinheiro de Montreal, que saiu de lá com medo dessa votação, nunca mais voltou. Ela, que era o centro das finanças, perdeu essa condição para Toronto”.
Nada a acrescentar. E somente lamentar a insensatez que parece estar tomando conta do mundo inteiro.



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