Descanso
Vezes há, quando a mente perde-se em conjecturas,
E, em busca da verdade, soberana, nas alturas,
Tenta, ao mirar do alto, a razão ou o porquê
De ser nossa existência a comédia que ela é.
É preciso estar munido de total desprendimento
Sem o qual não há saída desse corredor cinzento,
No qual tudo se comprime, adensando o mistério.
Pobre caminhar o nosso, sem escolha, sem critério.
Por saber que cá estamos por um mero acidente
Que ganhamos, sem pedi-los, sofrimentos de presente
É pretexto insuficiente pra deixar-nos revoltados.
Reclamarmos com o bispo por não sermos consultados.
É um sonho a ser vivido, ou um simples pesadelo?
Otimista é quem transforma calabouço em castelo!
Se possível, afastando para sempre o desespero.
Gênio, monstro ou retardado fazem jus ao mesmo zero.
Esse zero, por acaso, e a nota merecida.
É o triste somatório do que foi a sua vida.
O ridículo supremo o envolve pouco a pouco.
Discordar é o direito adquirido de ser louco.
Quem sonhou, um belo dia, ser o dono deste mundo,
Abiscoita o desespero, forte, intenso e profundo.
Pois em nada se alteram as andanças do planeta.
Sempre perderá as fichas, nessa mesa de roleta.
Argonauta, com coragem, achará seu velocino.
Ilusão cruel o aguarda: foi só obra do destino,
Do qual, ilusão funesta, não deixou de ser joguete.
Como se Jasão passasse de uma pobre marionete.
A vitória, que o embala, não passou de exceção.
Que o deixa vulnerável, preso à mistificação
De haver, por um momento, governado sua sorte.
O triunfo é do fraco, o fracasso é do forte.
Não resista, abandone, dê espaço a derrota.
O seu debater inútil vira alvo de chacota.
Não procure destacar-se, não irrite a torcida.
Que gargalha e festeja, comemora-lhe a ferida.
Largue tudo, renuncie e aceite o cambapé,
Mas se for preciso finja que jamais perdeu a fé.
Quando concluir seu ciclo, seu descanso será... lá.
Siga então esse conselho e descanse desde já!